Projeto Moradores de Rua e Seus Cães leva dignidade e respeito para as ruas de São Paulo
Ação oferece apoio a pessoas em situação de rua e seus bichos de estimação, com distribuição de alimento, ração, banho e tosa e castração
O cão é o melhor amigo do homem. Foi através dessa percepção que o fotógrafo de pets, Edu Leporo, decidiu sair dos estúdios para registrar o carinho e companheirismo entre moradores de rua e seus bichos de estimação. Em 2012, o fotógrafo criou o projeto Moradores de Rua e seus Cães. A ONG leva para as ruas ações que oferecem aos cães; alimentação, atendimento veterinário e banhos. Para o seu tutor, é oferecido o banho, uma refeição, uma troca de roupa, distribuição de kits de higiene pessoal, além de serviços como corte de cabelo e barba e orientações sobre os cuidados que devem ter com os seus pets. “Já pedimos ajuda do governo, mas nunca recebemos nada. Inclusive, para fazer uma ação para pessoas em situação de rua, a gente paga uma taxa por ocupar o espaço público”, comenta Edu.
Basta ter olhos para ver o aumento de pessoas vivendo nas ruas das grandes cidades desde o começo da pandemia. A população de rua superou as 281 mil pessoas no Brasil em 2022. Isso representa um aumento de 38% desde 2019, após a pandemia de covid-19, segundo um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em uma década, de 2012 a 2022, o crescimento desse segmento da população foi de 211%. A região Sudeste concentra pouco mais da metade da população em situação de rua do país: são 151 mil pessoas. Na sequência estão Nordeste, Sul, Centro-Oeste e Norte.
“Nem só de ração vive o cão”
A ONG conta com um time de voluntários e também com marcas que doam produtos e serviços. “Além de levar ração para o animal, o nosso projeto tem um olhar sobre o bem-estar e a saúde dele. Essa ação leva cuidado, vacinas, anti-puga, banho, ração e amor para os cães. Já vi cachorro com oito anos que nunca tomou um banho na vida. A criançada ganha o ‘burguer da rua’, onde uma hambúrgueria doa um lanche a cada dez vendidos. Prezamos também pelo cuidado com o dono do animal, pois imagina a vida de uma mulher em situação de rua sem um absorvente, por exemplo”, explica Edu.
Vilma de Freitas, de 50 anos, mora na ocupação na Princesa Isabel, região central de São Paulo, mas já foi moradora de rua. Vilma tem quatros cachorros e segundo ela, todos foram vacinados através da ONG. “Eu sempre acompanho o trabalho desse projeto e trago os cachorros para serem vacinados, tomarem banho e ganhar ração. Eu e meus filhos ainda fazemos uma refeição, somos orientados como cuidar do cãozinho e as crianças ganham hambúrguer”, conta.
“Depois da ação, a pessoa volta a se sentir gente”
Antes de morar na ocupação, Vilma morava no prédio de vidro no Paissandú, centro da capital paulista, que pegou fogo. Após isso, ela, quatro filhos e os cachorros foram morar na rua. “Passamos três meses morando na rua. No começo, a gente só ficava deitado no chão, mas logo em seguida veio as doações, que supria às necessidades do frio e fome. Quando chovia, era cruel e a gente perdia tudo. A gente dependia de doações para comer e conseguia tomar banho no Sesc”.
Edu conta que muitos moradores de rua deixam de ir para abrigos por não ter onde deixar seus cães. “Primeiro, não tem lugar para deixar a carroça, não tem espaço para o cão e quando tem, é muito precário”, diz o fundador da ONG. Segundo ele, a pandemia fez com que a população em situação de rua aumentasse. “Existem vários prédios vazios por São Paulo que poderiam acolher essas pessoas, pelo menos no inverno, mas isso não acontece. Agora no frio, o que mais acontece são pessoas que literalmente morrem de frio”, relata.
Após a passagem pela rua, Vilma lembra que ficou dois anos morando em abrigos com os filhos e cachorros, até conseguir se mudar para ocupação onde mora atualmente. “Durante a pandemia, eu achei que eu e minha família seríamos acolhidos pelo abrigo, mas tivemos que ir para rua de novo. Eu me sentia muito mal no período que estava na rua, pois as pessoas acham que todo mundo que está nessa situação usa droga ou bebe. Até no tocar, elas pensam que a gente vai passar doença. Eu tinha muito medo de dormir com meus filhos por conta da exposição. Nos primeiros dias, me ofereceram o caminho da prostituição e tráfico de drogas”, relembra. Hoje, Vilma está à procura de emprego.
O presidente da ONG ressalta a importância do projeto “De volta ao Lar”, criado pela instituição, onde pessoas em situação de rua são reintegradas e devolvidas para a família. Com ações mensais, a ONG está preste a completar a ação número 100 em São Paulo. Segundo Edu, desde 2015, mais de 6 mil animais participaram das ações.